-A monogamia 100% já era, foi para o saco, não existe mais.
Era a tese mais arrojada em debate na mesa ao lado, no meio da rua do Ouvidor, precisamente na Toca do Baiacu.
A discussão prossegue:
-A monogamia total nunca existiu, é que as coisas eram mais escondidas, não havia internet, redes sociais etc.
Acompanho com o ouvido de cronista de costumes, digo, cronista de futricas:
-Hoje o mais sonso e certinho dos maridos pula a cerca. Nem que seja a cerca da sacanagem virtual, mas que trai, trai.
-A mulher faz pior ainda, diz lá um exaltado Bentinho com umas brahmas no juízo.
Chego até a escutar o barulho dos tílburis da Ouvidor de Machado.
Na mesma mesa, uma fêmea com ares de Capitu capitula:
-Não conheço uma amiga casada que não tenha pelo menos um amante virtual!
-Mas só um flerte é do jogo, não conta como traição, é só o vício permanente da sedução, diz o sr. gravatinha com ares de gerente.
Hipérboles alcoolizadas à parte, nunca valeu tanto aquela velha sabedoria: o que os olhos não vêem o coração não sente.
A monogamia dos suicidas já era, cismou outro dia o escriba ultramarinho António Lobo Antunes.
Só sei que a discussão veio com a conta e um chorinho de obviedade e transparência:
-Nunca se traiu tanto –fechou a secretária com ares de explícita safadeza.
Você há de dizer, amigo, lá em casa não tem disso não.
Você há de dizer, amiga, uma traiçãozinha não mata ninguém, até estimula o desejo.
Pode ser. Nada como um marido culpado. Vira o melhor homem do mundo, inclusive na cama.
Nada como uma mulher que acabou de cometer um pecado fora de casa. Será capaz de caprichos orais nunca dantes.
Finda a discussão na mesa ao lado, eis que nossa távola, até então composta só de macho botafoguense, é iluminada com as presenças de Luisa e Kamille.
Que efeito sobre os homens da rua do Ouvidor. A graça divina. O mais casmurro dos viventes da área se docilizou.
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