terça-feira, 30 de setembro de 2014

QUANDO O SOFRIMENTO BATER À SUA PORTA - Pe. Fábio de Melo


São pensamentos profundos da vivência humana que o Padre Fábio de Melo nos propõe a refletir. Porque o sofrimento como as alegrias são contextos da nossa vida finita? Eles são necessário e para quê? Como encarar o sofrimento de forma madura, serena. Suas palavras são muitas ... daquelas que temos que sentir uma por uma de forma homeopática... devagarzinho.
É como bebêssemos numa bela taça de um excelente vinho tinto.
Roberta Carrilho




Diante da dor sofrida, mais vale um silêncio, uma pausa, que uma palavra inoportuna. Sofrimento é destino inevitável, porque é fruto do processo que nos torna humanos. O grande desafio é saber identificar o sofrimento que vale a pena ser sofrido. Perdemos a oportunidade de saborear a vida só porque não aprendemos a ciência de administrar os problemas que nos afetam. Sofremos demais por aquilo que é de menos. Sofrer é o mesmo que purificar. Só conhecemos verdadeiramente a essência das coisas à medida que as purificamos. Nossos valores mais essenciais só serão conhecidos por nós mesmos se os submetermos ao processo da purificação.

Nossos maiores valores costumam florescer a partir de nossos maiores sofrimentos. Sacrifício e sofrimentos são faces de uma mesma realidade. O sofrimento pode ser também reconhecido como sacrifício, e sacrificar é ato de retirar do lugar comum, tornar sagrado, fazer santo. Tudo depende da lente que usamos para enxergar o que nos acontece. Tudo depende do que deixaremos demorar em nós. A alegria ou a tristeza só poderão continuar dentro de nós à medida que nos deixamos afetar por suas causas. É questão de escolha.

Sofrimentos não precisam ser estados definitivos. Eles podem ser apenas pontes, locais de travessia. O corpo é território da dor. É nele que o sofrimento e todas as suas faces se concretizam. A dor é uma resposta natural do corpo. Ela sinaliza para o limite que possuímos. 

Quando o sofrimento bater à sua porta é melhor abrir. Resistir ou negá-lo é apenas um jeito de fugir do que mais cedo ou mais tarde você terá que enfrentar. 

O sofrimento é uma espécie de espelho onde nos enxergamos a partir do outro. O sofrimento é uma das molduras que dão sustento à nossa existência. É o tecido que envolve a vida. O sofrimento é humano, o sofrimento é natural. Sofrimentos nascem de limites. Toda vez que precisamos lidar com tudo o que não podemos é natural que sejamos acometidos por sofrimentos. A vida é constante experiência de limites, isto é, de fronteiras. Estamos em êxodos intermináveis, passagens que realizamos todos os dias. Temos um limite que nos marca, mas este limite não pode nos determinar. Ele pode servir como sinal para as mudanças que deles nascem.

Sofrer é o mesmo que estar vivo. Sofremos porque somos limitados. O conceito de limite é positivo, pois nos dá a capacidade de reconhecer o que podemos e o que não podemos. A negação é um recurso que não minimiza o limite, ao contrário, ela o fortalece, potencializa-o. Os obstáculos não podem ser causa para sua desistência, porém, devem figurar em sua vida como um sinal de tudo aquilo que ainda será melhor. 

Pecado é todo ato falho cometido de forma consciente, que tem o poder de repercutir em Deus, em nós, e na sociedade em que vivemos. Do limite da condição humana nascem os sofrimentos, mas este limite, ao se desdobrar no dia a dia de nossa vida, pode funcionar como impulso para nossas superações constantes. Tudo depende da forma como nos posicionamos diante dos desdobramentos.

Descubra nas pequenas coisas o quanto é preciso ser humano. Não se esqueça que Deus não o quer perfeito. Deus o quer santo. Só isso. Busque a santidade por meio de caminhos possíveis, simples. Nós complicamos demais a vida, e por esse motivo sofremos tanto. Deus é simples. Prefere os caminhos inusitados. As questões humanas, as mais naturais, são os lugares preferidos da revelação de Deus. A dor humana é lugar de revelação divina. Ao experimentar-se limitado, o ser humano vive a bonita possibilidade de descobrir a Deus como resposta e complemento para tudo o que lhe é ausente. Ele prova de Deus. Experimenta sua força a lhe sustentar, porque ao olhar nos olhos de seus limites, surpreendentemente ele consegue descobrir os olhos de Criador. Estar diante dos limites é como estar diante da necessidade de Deus. É como o filho, que diante do perigo grita pela presença do pai.

Olhar nos olhos de Deus no momento da fragilidade requer maturidade. Crer que Deus nos reconhece frágeis, pecadores, e mesmo assim continua nos amando, é desafio de considerável grandeza. Conhecer a Deus a partir do amor é garantia de experiência frutuosa. Quando descobrimos nos olhos de Deus o amor e o acolhimento, reconhecemos naquele que nos olha o respeito por quem somos.

Respeitar os limites é considerá-los, isto é, consiste em agir de acordo com eles. Temer os limites é o mesmo que se curvar a eles. Respeito é totalmente diferente de medo. Da mesma forma que precisamos respeitar a Deus, mediante a experiência do amor, também precisamos respeitar o nossos limites, mediante a experiência do cuidado com eles. O limite humano só tem sentido se costurado no manto redentor de Cristo. É nele que descobrimos o significado de nossa fraqueza, é nele e a partir dele que nos encorajamos a olhar nos olhos dos nossos limites.

Ao lançar os olhos naquele que nos fortalece, o limite se transforma em motivo de aproximação. A condição de necessitado não precisa ser vergonhosa.

Carecer é o mesmo que necessitar. Cristo está para o ser humano assim como a asa está para o pássaro. É Ele que nos eleva. Ele é que nos retira da miséria de nossos limites para nos oferecer possibilidades. 

Cuidar do que somos é o mesmo que cultivar o que Cristo nos faz ser. Amar é como emprestar sentido. É o mesmo que socorrer o outro de suas necessidades mais profundas. Quando bem interpretada, a experiência do limite nos impulsiona para a experiência do cuidado. E cuidar é o mesmo que amar. Diante da fragilidade do outro, o primeiro ato precisa ser de acolhimento. Do limite pode nascer o amor. Diante da fraqueza que nos envolve, o amor nasce como solução. Corações empenhados em uma mesma causa. A dor que não é nossa nos atinge e nos envolve. Quanto mais amamos, muito mais sofremos por aqueles que amamos. É natural, inevitável. O outro que sofre nos provoca. Algo que é dele nos atinge. E diante do seu sofrimento reagimos. 

Ninguém luta sem dor. Sempre que precisamos estabelecer lutas é natural que sofrimentos aconteçam. Diante do sofrimento dos que amamos que descobrimos o amor como desdobramento da dor, e esta como desdobramento do amor. Quem quiser amar terá que saber que não há amor sem sofrimento. O amor é uma força capaz de nos levar a sacrifícios concretos a ponto de tocarmos a nossa humanidade mais profunda. Sempre que amamos de verdade extraímos o que temos de mais puro em nós. O amor nos faz chegar a lugares nunca antes imaginados. O amor exerce o poder de socorrer, resgatar, redimir. A confissão é sincera. O que nos fascina no outro é o que nos falta. O amor nos salva de nossas carências, de nossas necessidades. É uma forma de suprir nossas limitações de maneira honesta e responsável. O amor se trata de emprestar a asa que nos é ausente.

Ao reconhecer no outro o que me falta, descubro dentro de mim, a partir dele, o recurso para encontrar a saída. Só quem ama é capaz de sacrifícios. É a regra.

Quem foi que disse que a bondade pode livrar alguém da condição de ser limitada? A bondade não é uma bolha de proteção que tem o poder de livrar as pessoas das fatalidades da vida. Refletir sobre o sofrimento é essencialmente refletir sobre os limites, isto porque tudo o que nos limita, de alguma forma, nos expõe a um contexto de angústias, ansiedades e questionamentos. 

Sofremos porque não podemos tudo o que queremos. Sofremos porque somos afetados constantemente por situações que nos desinstalam e nos entristecem. Sofremos porque não conseguimos abarcar a totalidade dos fatos, ou porque nem sempre podemos compreendê-los. Sofremos porque não encontramos as respostas que necessitamos, ou porque nos deparamos com respostas que nos assustam. Sofremos porque não somos capazes de fazer tudo sozinhos; somos dependentes dos outros. Sofremos porque carecemos, porque somos incompletos, porque somos inacabados. Sofremos porque nem sempre podemos mudar a ordem das coisas, a sequência dos acontecimentos. Sofremos porque nos apegamos aos outros, e por vezes os afastamentos são inevitáveis. Sofremos porque nos traímos, os abandonamos. Sofremos porque somos injustamente julgados, ofendidos, caluniados. Sofremos por uma infinidade de coisas e não temos como mudar o fato de sermos naturalmente afetados pelos desajustes da vida.

Se não temos como mudar a vida, então precisamos descobrir um jeito de sermos transformados por ela. Se eu não posso mudar o fato de ter que sofrer, então posso encontrar um modo de como sofrer. A matéria que nos faz sofrer nem sempre é tão grave. O problema é a forma de lidarmos com ela. O revestimento que damos aos nossos problemas torna-se maior do que o próprio problema. Mesmo que seja natural, o sofrimento ainda é enfrentado como se fosse um inimigo. Diante de tudo o que não podemos mudar, há sempre o que podemos aprender e compreender. O movimento possível diante da dor. Encontrar nela alguma resposta, ainda que silenciosa, que nos sugira e proporcione um aprendizado. 

A sabedoria nos ensina que diante de uma vida que sofre, as perguntas podem parecer inoportunas. Uma atitude vale muito mais. O bom da vida não está em chegar às respostas, mas sim em aprender a conviver com as perguntas.

O não saber não é uma prisão, ao contrário, é uma fonte de liberdade. Achar um culpado para nossa desgraça é apenas uma tentativa de solucionar o que nos aflige. Mas é em vão. Responsabilizar culpados pode até nos aliviar em algumas coisas, mas definitivamente não pode nos curar de nossas ausências. A palavra tem o poder de renascer o que está morto. Tragédias são realidades absurdas. E absurdo é tudo aquilo que parece não ter coerência, porque fere radicalmente o sentido das coisas. O sofrimento só será suportável à medida que as perguntas inférteis deixarem de ser feitas.

Reassumir a vida depois de uma tragédia é sempre um desafio sofrido. Corações machucados podem ser sementeiras de um mundo novo. Sempre que somos machucados pela vida, temos diante de nós uma sementeira. Crescerá o que a gente semear. Diante dos sofrimentos, cada um reage como pode. Nossa atitude em relação ao que a vida nos traz é o que nos difere como pessoas. 

Frente ao inevitável e de tudo o que é imutável, é sempre desafiador reencontrar o equilíbrio para prosseguir. Há sofrimentos que buscamos com as mãos. São as escolhas conscientes que fazemos e que, mais cedo ou mais tarde, teremos que enfrentar. A vida é um tecido cuja matéria é composta de atitudes. São elas que delineiam o contexto de nossas escolhas. Atitude refere-se ao modo como nos posicionamos frente aos acontecimentos, às pessoas, às situações.

Ninguém muda de atitude sem a experiência do esforço. Se conseguimos alterar as nossas atitudes, naturalmente conseguimos também alterar a vida. É interessante refletir sobre tal aspecto, pois não é comum identificarmos isso em nós. Se estamos sofrendo com a vida que vivemos, é justamente porque ainda não os dispomos a mudar as nossas atitudes. Nem sempre somos culpados pelas doenças que desenvolvemos, mas não podemos negar que boa parte das enfermidades que nos acometem são provocadas por nossos hábitos de vida. Nós buscamos tudo isso com as próprias mãos. 

Será que as consequências de nossas escolhas de agora, num futuro próximo, poderão doer no coração dos que amamos? Chegará o momento em que não nos restará muita coisa. Mais cedo ou mais tarde a vida nos cobrará. As escolhas de hoje repercutirão em breve neste tempo que costumamos chamar de futuro. Viver é como gritar no abismo. É impossível não sofrer com as consequências de tudo o que escolhemos. O eco é uma resposta natural do abismo. Escolhas são como sementes. O que plantamos hoje será fruto amanhã. A qualidade do fruto depende do que semeamos. Não há milagre que possa reverter o que foi semeado.

A crença na providência divina consiste em considerar que do Dom que vem de Deus sempre nasce uma responsabilidade humana. O Dom nos exige uma resposta. É preciso reagir diante do que recebemos. Deus nos deu saúde, mas agora somos nós quem precisamos cuidar dela para que continuemos saudáveis.

O jeito como reagimos diante de uma determinada situação depõe contra ou a favor do que consideramos como maduro em nós. A maneira como interpretamos as coisas ruins que nos acontecem é um modo interessante de medir o nosso grau de maturidade. Assim como somos capazes de escolher o bom, também escolhemos as coisas ruins. 

Deus não quer as tragédias do mundo. As tragédias humanas são construídas aos poucos, por nós mesmos. É preciso maturidade para assumir. Pais que querem ver os filhos maduros não assumem as responsabilidades que são próprias deles. O máximo que fazem é orientar as decisões, aclarar os caminhos, mas nunca viver por eles. A tristeza do outro nos chama atenção para nossas tristezas, e nem sempre temos coragem de enfrentar as desarmonias de nosso mundo pessoal. Muito mais interessante seria se a gente tivesse a sabedoria e a coragem de reconhecer as falhas humanas, mesmo que para isso tivéssemos que permanecer sem respostas para as nossas questões. Sofrimento é experiência de humanização. 

A juventude é um período que favorece muitas fugas. A impulsividade é a marca desta fase. Envelhecer é um processo natural. Estamos expostos aos efeitos do chronos, o tempo que passa. O corpo é território da realização humana. O corpo é a casa das possibilidades, mas também é a casa dos limites. Por ser constituído de matéria frágil, durante toda a vida o corpo experimenta o sofrimento da dor física. A dor é uma resposta do corpo, cujo objetivo é anunciar que ago não vai bem. A dor parece fazer parte do instinto de preservação da vida. Ela presta o ofício de denunciar que algo está errado. É o corpo dizendo a ele mesmo que há uma desordem a ser considerada. Algum detalhe do seu funcionamento está em desarmonia e alguma atitude precisa ser tomada. 

A dor é uma forma de anúncio. É uma reação natural do corpo que não quer sofrer, do corpo que carece ser socorrido. A dor aparece ser uma fala do corpo que não quer morrer. É como se ela se tornasse representante do medo que sentimos do destino final. Sofrer é sempre processo penoso. Toda vez que somos expostos a situações dolorosas, acentua-se dentro de nós a condição de fragilidade. A dor fragiliza ainda mais o que já é frágil. A dor nos expõe à dura verdade de que somos finitos, de que somos passageiros e que em algum momento a aventura da vida deixará de ser possível para nós.

Envelhecer consiste em sofrer um universo de perdas, e nisto está a causa do que nos inquieta. Sofrer de velhice é destino inevitável. A velhice é acontecimento processual, cresce aos poucos, de maneira que não é possível saber o quanto dela já está nos atingindo. O tempo todo estamos perdendo. O tempo não pára, não dá tréguas. É claro que estas perdas vão se acentuando com o acúmulo de anos, mas cada fase da vida possui perdas e danos. O inegável é que a velhice começará em nossa vida quando nos prendermos nas perdas. 

A vida não é só perda. Há sempre uma forma de lucrar com o que perdemos. Saber finalizar uma fase da vida requer tanta sabedoria quanto para iniciar. Tão importante quanto saber ganhar é saber perder. Muitos sofrimentos são causados na nossa vida porque não sabemos perder, não sabemos atravessar a ponte, não sabemos mudar de estação. Não seremos eternamente jovens, mas nem por isso estaremos fadados a viver a condenação da infelicidade.

A realização humana é possível em todas as etapas da vida. O importante é saber viver bem o específico de cada tempo, pois esta é uma forma interessante de construir os alicerces da próxima etapa. Perder, nós perderemos sempre, mas as perdas são tão necessárias quanto os ganhos. É só olhar diferente para elas. Se assim o quisermos, elas se configurarão como portas para muitas outras possibilidades. 

Homens e sonhos se confundem e se completam em fusões constantes. Somos a mistura de sonhos e realidades. Há uma inegável conexão entre os dois pontos. Sonhos não envelhecem. Eles sobrevivem, mesmo com o acúmulo dos anos, e por isso eles podem funcionar como fórmula para rejuvenescer a alma, enchendo-a de novas e surpreendentes perspectivas. Estamos naturalmente condicionados a estabelecer um pacto com a vida a partir de nossa utilidade. 

Nossas relações humanas são fortemente marcadas pelas regras da utilidade. Somos o que fazemos. Quando pautamos nossa vida a partir de nossa utilidade, corremos o risco de nos desprender de nossos verdadeiros significados. Por vezes, encostamo-nos em alguns moldes de vida que são semelhantes às ondas. São oportunidades cheias de encanto, mas sem nenhum sustento futuro. São fogos de artifício, fugazes e de rápida passagem. Quanto maior for o número de realidades fugazes escolhidas e incorporadas, maior será a possibilidade de frustrações futuras. A vida é como uma equação matemática. Ela é possível de ser administrada. O cálculo é possível. O que somamos e subtraímos, o que multiplicamos e dividimos, serão resultado final, um dia, em nossas mãos. 

As escolhas da juventude costumam repercutir no modo como envelhecemos. O que construímos no dia de hoje será fundamental para as realidades futuras. Laços sanguíneos não são garantia de nada. Não basta ser irmão, pai, filho, mãe. Há que se ter um algo a mais. É no cultivo do dia a dia que fortalecemos os papéis atribuídos pelas funções biológicas. 

Há outras pessoas que são mais importantes em nossa vida que muitos de nossos parentes. É inegável que nem sempre somos conscientes do poder definitivo que há nas escolhas do nosso agora. Viver é escolher. A matéria-prima do futuro está diante de nossos olhos nos dias de hoje. O que é de amanhã, no agora da vida está se dando. A vida cresce, amadurece e se transforma no impulso de nossas escolhas. O contrário também é verdadeiro. A vida atrofia, apodrece e fenece no impulso do que escolhemos cultivar. O que hoje ensinamos ou motivamos pode, mais cedo ou mais tarde, se voltar contra nós. Escolhas conscientes e bem feitas hoje podem evitar sofrimentos futuros. A vida é experiência de preparos constantes. A regra é clara. 

Defeitos geram sofrimentos. Cada vez que nos experimentamos defeituosos, de alguma forma tocamos e identificamos nossa condição de homens e mulheres limitados. Defeitos são experiências concretas do limite. O limite, quando não assumido como impulso para a mudança, será sempre uma porta para a dor. O ciúme nasce da insegurança e do desejo de posse. Possuir o outro é um jeito de neutralizar a insegurança afetiva. Quem muito recebe, corre o risco de não aprender a estabelecer limites para as suas necessidades. É como um poço sem fundo. Mesmo que joguemos nele porções imensas de terra nunca o preencheremos. 

A superação é o destino de quem se empenha. Quando a vitória se torna mais difícil, a superação será sempre possível. O ser humano, quando estimulado, é capaz de reações surpreendentes. Há muitos sofrimentos que nascem de nossa indisciplina. Indisciplina é uma forma de negligência que atinge diretamente a nós mesmos. O que hoje deixo de fazer e que seria importante para o meu crescimento, de alguma forma, repercutirá como consequência desagradável. Quanto mais me entregar ao caminho fácil de minhas desculpas, mais difícil será iniciar o processo de transformação. Nossas desculpas funcionam como um mecanismo de defesa. Nelas a gente se esconde para evitar a mudança e o esforço que ela exigirá. Mudar requer esforço, por isso disciplina é sinônimo de dor. O destino do corpo é inevitável. Ele envelhecerá e perderá a vitalidade. Consequentemente, ficaremos privados de muitas possibilidades. Mas uma coisa eh certa. A alma não precisa envelhecer. Sempre será tempo de superar os limites de nossa personalidade e assumir um comportamento mais harmônico e sereno. Este é o propósito dos sábios. 

A mente nos faz sofrer. A mente é também o território do sofrimento. Boa parte da dor que dói no mundo tem na mente o seu local de origem. Quando a doença é na mente, a cura só pode vir mediante a reorganização do pensamento. Muitos sofrimentos provenientes da mente podem ser resolvidos no momento em que substituímos um pensamento ruim por um bom.

Muitos sofrimentos nascem dos nossos pensamentos. Entender é ato de perceber, compreender, captar pela força da inteligência. Entender é também perceber a razão, isto é, ir mais a fundo. Mudar o jeito de pensar sobre determinada realidade ou situação requer que a gente vá mais fundo. É como tentar ver uma realidade do avesso. Quando me recuso a mudar, de alguma forma estou me privando do crescimento necessário e merecido. 

Sofremos muito, mas também não podemos negar que sofremos por questões insignificantes. Sofremos por falta de inteligência. Sofremos por não termos capacidade de analisar com profundidade os problemas que nos afligem. Sofremos por falta de entendimento. Sofremos por falta de iniciativas. Sofremos por falta de perseverança. Sofremos por inércia, por comodismo. Muitos sofrimentos serão extirpados de nossa vida apenas se lançarmos um olhar diferente sobre eles. 

Pensamentos positivos podem aliviar a alma de sofrimentos tortuosos. Um novo significado, ou uma nova interpretação de um fato, só poderá acontecer mediante o exercício do pensamento. O bom terapeuta é aquele que consegue nos encaminhar para uma nova interpretação de tudo aquilo que nos oprime. Uma realidade passada não pode ser modificada. Ninguém pode fazer voltar os acontecimentos e transformá-los em outros. O acontecido já é definitivo em nós. Mas o que não precisa ser definitivo é o jeito como olhamos para o acontecimento. Nisso consiste a terapia. Reorganizar os efeitos do passado. Examinar a vida é revesti-la de qualidade. 

Boa parte de nossos sofrimentos são frutos de pouca reflexão. Muitos de nossos conflitos sobrevivem de nossa ignorância. A reflexão é um atributo humano. Nossa capacidade de pensar a realidade nos diferencia dos demais seres. O inegável é que a vida adulta deveria ser o auge de nossa compreensão das coisas. A isso chamamos de maturidade. Uma pessoa é madura à medida que consegue estabelecer o sentido das coisas. Se não somos estimulados pelos "por quês" da vida, corremos o risco de viver sem perguntar e consequentemente de viver sem aprender. Refletir é um atributo humano. Somente nós podemos descobrir o oculto que está por trás de tudo. A reflexão é possível em qualquer ocasião. Se não refletimos, é porque não queremos ou perdemos o hábito, mas uma coisa é certa: a reflexão é necessária em todas as nossas decisões, afinal ela qualifica o nosso jeito de ser e estar no mundo. Quanto mais uma pessoa é capaz de pensar a vida, suas escolhas e o jeito de encaminhar suas decisões, maior será a possibilidade de uma experiência harmônica e equilibrada de si mesma e dos outros.

Um pouco de filosofia não faz mal a ninguém. Boa parte dos nossos sofrimentos podem ser resolvidos com o simples ato de pensar um pouco mais sobre eles. O sofrimento será sempre mais suportável à medida que somos capazes de racionalizar as causas que o move. Se descobrirmos o pensamento que nos faz sofrer e o reinterpretarmos, de alguma forma já estamos iniciando a superação. A reflexão pode minimizar os efeitos dos sofrimentos que enfrentamos. A vida continua penosa mesmo quando refletimos, mas é inegável que a reflexão consegue dar um sustento muito interessante ao nosso processo humano, afinal ela abre portas que até então estavam fechadas. A serenidade é fruto da mente bem esclarecida e bem norteada por um pensamento saudável.

O sofrimento nasce da irreflexão. Se mudarmos o jeito de pensar por meio de uma reflexão, naturalmente poderemos extirpar o que antes nos atormentava. Por vezes os medos são capazes de nos roubar a reflexão. Muitos sofrimentos nascem de nossas confusões mentais. A análise tem o poder de reordenar as ideias. 

A calma da reflexão é que facilitará encontrarmos a melhor saída. A calma é essencial para que sejamos capazes de encontrar o caminho. Muitos sofrimentos nascem de nossas confusões mentais. Pessoas desesperadas são pessoas em profundo estado de confusão mental. Pessoas desesperadas não costumam lidar bem com os problemas que enfrentam. Administrar os sofrimentos no momento do desespero é tarefa árdua. Fatos não podem ser modificados, mas as consequências deles em nós sim. Quando estamos desesperados, necessitamos fazer a triagem das causas. Se não temos mais como alterar o fato, teremos então que investir nas consequências. Perguntar o porquê se sofre é tão importante quanto sorver o ar para se manter vivo. É a partir desta pergunta que descobriremos se temos ou não razões para o sofrimento.

Sofrimento sem razão é sofrimento infértil. Sofrimento sem razão são sofrimentos que poderiam ser evitados, caso a pessoa se dispusesse a fazer uso de sua reflexão. Exemplo disso são os sofrimentos que nascem dos medos. Medos muitas vezes infundados, medos nascidos de bobagens que resolvemos acreditar. Assim que racionalizo o medo, naturalmente ele perde o poder sobre mim. Um sofrimento só valerá a pena se ele for verdadeiro. Sofrer por mentiras é um absurdo. Quando identificamos um sofrimento verdadeiro, precisamos nos render a ele. Render-se ao sofrimento é reverenciar sua sacralidade, reconhecendo nele todo o crescimento que se desprenderá dele. É preciso sair dos estreitos labirintos de nossas dores mesquinhas para que possamos contemplar os amplos e largos espaços das dores transformadoras.

Garimpar diamantes é arte que exige ciência. O grande desafio do garimpeiro é encontrar a pedra preciosa no barro. É surpreendente, mas saber sofrer é uma arte que exige a mesma ciência. 

Sentido é o alicerce de uma realidade. O sentido é a coerência da realidade. Tudo o que realizamos, por menor que seja, sempre está amparado por um sentido oculto. Descobrir o sentido das coisas é um jeito interessante de investigar a vida, deixar a superfície e atingir o lugar menos comum, mais profundo.O sentido é o motivo de nossas ações. O que faço tem sempre sua raiz no por que faço. Toda pergunta é, de alguma forma, a busca por um sentido. No momento em que sofremos, perguntamos. Nossas perguntas estão sempre a serviço do sentido que buscamos. A vida humana é cheia de absurdos, mas também cheia de sentidos. Absurdos e sentidos andam lado a lado porque são realidades complementares. O absurdo é o impulso que nos faz querer o sentido. Sempre que estamos diante de um fato que não tem sentido, isto é, um absurdo, somos desafiados a descobrir o caminho para a construção do sentido. É a partir desta construção que nos recuperamos. Só assim podemos sarar as consequências que o sofrimento provoca em nós. A construção do sentido favorece a continuidade da vida. As perguntas mais fundamentais nascem de nossa incompreensão da vida e seus absurdos. 

Recomeços são sempre dolorosos. Por meio dos sofrimentos é necessário redescobrir o valor das pequenas alegrias. Lamentavelmente, tudo o que é grandioso pode nos cegar para a percepção de coisas menores, ainda que mais belas. Há dores que parecem reunir todos os motivos humanos num só lugar. 

O altar é o lugar privilegiado do encontro de Deus com a humanidade. No altar, tudo o que é humano se diviniza. Divinizar é recolher e reconhecer a sacralidade. É retirar do profano, isto é, retirar o que está fora do templo e colocar sobre o local sagrado. Sacralizar o sofrimento é reconhecê-lo como oportunidade de transformação. O que sofremos passa a nos transformar, pois nos colocar no altar da vida, para que Deus nos recolha como oferenda agradável aos seus olhos. Somos como o pão e o vinho, e em Cristo seremos transformados. É claro que se pudéssemos escolher, escolheríamos não sofrer. Mas não há como mudar essa regra - o sofrimento humano é natural, é inevitável. Em algum momento da vida, ele nos esbarrará. Sofrer sim, mas sofrer apenas por causas que mereçam o nosso sofrimento. Sofrer, mas buscar o sentido oculto que está por detrás das profusas ramagens dos absurdos. Sofrer, mas nunca esquecer que depois da tempestade há sempre um sol preparado, pronto para brilhar e nos dourar com sua luz tão envolvente. Porque tão importante quanto não fechar a porta para os sofrimentos é não impedir, depois, a entrada das alegrias...


Pe. Fabio de Melo


#ITAMISERÁ #ITADISGRAÇA - Um dos melhores vídeos engraçados que já assisti




"Itadisgraça! Itamisera! Porra do cacete! Vai se lascar! Eita moléstia! Disgruda caraio! Seu macho frouxo da porra! Vai tomar um cacibó! Vai se fuder aqui! Vai pro zap este vídeo... espera ai rapaz! Perai o caralho, porra! Putaaa que pa riuuuu".
Eu ri muitoooooooo deste vídeo... que 'palavriado' mais da hora é este minha gente!?! Vale a pena assistir e ri você também!
Não tem como não dar umas boas gargalhas. É este humor que eu gosto! Inocente e criativo.
Roberta Carrilho

P.S.: Sem autoria - infelizmente!







segunda-feira, 29 de setembro de 2014

PARABÉNS MAFALDA PELOS SEUS 50 ANOS DE EXISTÊNCIA





FELICIDADES MAFALDA 
5O AÑOS DE EXISTENCIA! 

Me encantan tus preguntas y su astucia. Me gustaría que más 50 años muchas historias interesantes para compartir nosotros.
Felicidades Quino para el talento!

Abrazos, 
Roberta Carrilho 


Há 50 anos atrás, Joaquin Salvador Lavado - o Quino, dava ao mundo uma obra prima. Desde então, a Mafalda entra na vida das pessoas dando voz e força pra muitos que não encontravam as palavras para os momentos de revolta, desconforto e tantas situações em que nos identificamos com os personagens da turma. Atuando como Alter Ego de uma década cheia de coisas a serem ditas e colocadas pra fora de alguma forma, ela vem logo na primeira tiragem, cutucando a falta de acesso à bens necessários com a inocência de uma criança que faz um desenho simples. Talvez ninguém imaginaria que em 2014 toda a voz da Mafalda seria ainda tão articulada a atual. Pois bem.. para os fãs desta garota/senhora, aproveitem o dia de hoje. Tenho certeza que a Mafalda estará brilhando em muitas mídias por aí...





sábado, 27 de setembro de 2014

I SHOULD HAVE KNOW BETTER - Jim Diamond (1984) Legendado


  • Roberta Carrilho já chorei demais escutando esta música ... de amores que se foram... dancei também muito nos bailinhos nas casas de amigos .... usava aquelas saias de malha canelada até o joelho e blusa com ombreira.... risos! ótima música ... Josi Carvalho Gold times!!!








TODO HOMEM SÁBIO É SERENO por Divaldo P. Franco - Joanna de Ângelis |Dimensões da Verdade|


A serenidade é conquista que se consegue a esforço pessoal e passo a passo. Pequenos desafios que são superados, irritação que se faz controlada. Desajustes emocionais corrigidos, vontade bem direcionada, ambição freada São experiências para aquisição da serenidade. Um espírito sereno, já se encontrou consigo próprio, sabendo o que, exatamente deseja da vida. A serenidade harmoniza, exteriorizando-se de forma agradável para os circunstantes. Inspira confiança, acalma e propõe afeição.


O homem sereno já vence grande parte da luta. Que nenhuma agressão exterior te perturbe, levando-te à irritação, ao desequilíbrio. Mantém-te sereno em todas as tuas realizações. A tua paz é moeda arduamente conquistada, que não deves atira fora por motivos irrelevantes. Os tesouros reais, de alto valor, são aqueles de ordem íntima, que ninguém toma Jamais se perderem e sempre seguem com a pessoa. Tua serenidade, tua gema preciosa. Diante de quem te enganou, traindo a tua confiança, o teu ideal, ou envolvendo-te em malquerença, mantém-te sereno. O enganador é quem deve estar inquieto, e não a sua vítima. Nunca permitas demonstrar que foste atingido pelo petardo da maldade alheia. No teu círculo familiar ou social sempre defrontarás com pessoas perturbadas, confusas e agressivas. Não te desgastes com elas, competindo na mesma faixa de desequilíbrio em que se fixam. Constituem teste à tua paciência e serenidade. Assim, exercita-te com essas situações para,mais seguro, enfrentares os grandes Testemunhos e provações do processo evolutivo. Sempre, porém, com serenidade.


Dimensões da Verdade
Divaldo P. Franco
Joanna de Ângelis


sexta-feira, 26 de setembro de 2014

ORIGENS DO SOFRIMENTO por Carl Gustav Jung




Ainda segundo o budismo, as origens do sofrimento se apresentam por meio de condições internas e externas, resultando daí outras duas ordens: as cármicas e as emoções perturbadoras. Indubitavelmente, conforme acentua a Doutrina Espírita, o homem é a síntese das suas próprias experiências, autor do seu destino, que ele elabora mediantes os impositivos do determinismo e do livre-arbítrio. Esse determinismo (inevitável apenas em alguns aspectos: nascimento, morte, reencarnação) estabelece as linhas matrizes da existência corporal, propelindo o ser na direção da sua fatalidade última: a perfeição relativa.

Os fatores que programam as condições do renascimento do corpo físico são o resultado dos atos e pensamentos das existências anteriores. Ser feliz quanto antes ou desventurado por largo tempo depende do livre-arbítrio pessoal. A opção por como e quando agir libera o Espírito do sofrimento ou agrilhoa-o nas suas tenazes. A vida são os acontecimentos de cada instante a se encadearem incessantemente. Uma ação provoca uma correspondente reação, geradora de novas ações, e assim sucessivamente. Desse modo, o indivíduo é o resultado das suas atividades anteriores. Nem sempre, porém, se lhe apresentam esses efeitos imediatamente, embora isso não o libere dos atos praticados.

É possível que uma experiência fracassada ou danosa, funesta ou prejudicial se manifeste a outras pessoas, como ao seu autor por meio dos resultados, após a próxima ou passadas algumas reencarnações. Esses resultados, no entanto, chegarão de imediato ou em mais tardio tempo. O certo é que virão em busca da reparação indispensável. Da mesma forma, as construções do bem se refletirão no comportamento posterior do indivíduo, sem que, necessariamente, tenham caráter instantâneo. O fator tempo, na sua relatividade, é de somenos importância.

Portanto, os sofrimentos humanos de natureza cármica podem apresentar-se sob dois aspectos que se complementam: provação e expiação. Ambos objetivam educar e reeducar, predispondo as criaturas ao inevitável crescimento intimo, na busca da plenitude que as aguarda. 

A provação é a experiência requerida ou proposta pelos Guias espirituais antes do renascimento corporal do candidato, examinadas as suas fichas de evolução, avaliadas as suas probabilidades de vitória e os recursos ao seu alcance para o cometimento. Apresenta-se como tendências, aptidões, limites e possibilidades sob controle, dores suportáveis e alegrias sem exagero, que facultem a mais ampla colheita de resultados educativos. Nada é imposto, podendo ser alterado o calendário das ocorrências, sem qualquer prejuízo para a programação iluminativa do aprendiz. No mapa dos compromissos, não figuram as injunções mais aflitivas nem as conjunturas traumatizantes irreversíveis. As opções de como agir multiplicam-se favoravelmente, de forma que, havendo arestas a aplainar, esse trabalho não impõe uma ação imediata pelo sofrimento.

A ação do amor brinda o ser com excelentes ensanchas de alterar para melhor o seu desempenho e as suas atividades, constituindo-lhe suportáveis provas o malogro de alguma aspiração, o desafio ante algumas metas que lhe parecem inalcançáveis, as dores dos processos de desgaste orgânico e mental, sem as quedas profundas nos calabouços das paralisias, das alienações, das doenças irrecuperáveis. Se tal proceder, ainda poderemos catalogar como escolha pessoal, por acreditar o candidato ser esse o meio mais eficaz para a sua felicidade próxima, liberando-se da canga rude da inferioridade moral. 

Poder-se-á identificar essa providencial escolha, na resignação e coragem demonstradas pelo educando e até mesmo na sua alegria diante das ocorrências dolorosas. As provações se manifestam, dessa forma, de maneira suave, lenificadora no seu conteúdo e abençoada nas sua finalidades. Sem o caráter punitivo, educam de forma consciente, incitando ao aproveitamento da ocasião em forma eficiente e mais lucrativa, com o que equipam aqueles que as experimentam, para que se convertam em exemplos, apóstolos do amor, do sofrimento, missionários do bem, mártires dos ideais que esposam, mesmo que no anonimato dos testemunhos, sempre se tornando modelos dignos de ser imitados por outras pessoas. 

As provações mudam de curso, suavizando-se ou agravando-se conforme o desempenho do Espírito. A eleição de certas injunções mais difíceis no processo evolutivo representa um ato de sabedoria, tendo-se em vista a rapidez da existência corporal e os benefícios auferidos que são de duração ilimitada. Considerando-se a vida sob o ponto de vista causal, das suas origens eternas, as ocorrências na esfera física são de breve duração, não se alongando mais do que um curto período que, ultrapassado, deixa as marcas demoradas de como foram vivenciadas. Valem, portanto, quaisquer empenhos, os sacrifícios, as provas e testes que recompõem os tecidos dilacerados da alma, advindos das anteriores atitudes insensatas.

Toda aprendizagem propõe esforço para ser assimilada e toda ascensão exige o contributo da persistência, da força e do valor moral. Os compromissos negativos, pois, ressurgem no esquema da reencarnação como provações lenificadoras, que o amor suaviza e o trabalho edificante consola. 

As expiações, todavia, são impostas, irrecusáveis, por constituírem a medicação eficaz, a cirurgia corretiva para o mal que se agravou. Semelhante ao que sucede na área civil, o delinquente primário tem crédito que lhe suaviza a pena e, mesmo ante os gravames pesados, logra certa liberdade de movimento sem a ter totalmente cerceada. O reincidente é convidado à multa e prisão domiciliar, conforme o caso, no entanto, aquele que não se corrige é conduzido ao regime carcerário e, diante de leis mais bárbaras, à morte infamante.

Guardadas as proporções, nos primeiros casos, o infrator espiritual é conduzido a provações, enquanto que, na última hipótese, à expiação rigorosa. Porque o amor de Deus vige em todas as Sua leis, mais justas do que as dos homens, seja qual for o crime, elas objetivam reeducar e conquistar o revel, não o matando, isto é, não o extinguindo. Jamais intentam vingar-se do alucinado, antes buscam recuperá-lo, porque todos são passiveis de reabilitação. O encarceramento nas paresias, limitações orgânicas e mentais, as paralisias, as patologias congênitas sem possibilidade de reequilíbrio, certos tipos de loucura, de cânceres, de enfermidades degenerativas se transformam em recurso expiatório para o infrator reincidente que, no educandário das provações, mais agravou a própria situação, derrapando para os abismos da rebeldia e da alucinação propositais. 

Entre esses, suicidas premeditados, homicidas frios, adúlteros contumazes, exploradores de vidas, vendedores de prazeres viciosos, tais como as drogas alucinógenas, o sexo, o abandono da esposa, a desilusão amorosa imposta ao cônjuge inocente, o álcool, os jogos de azar, a chantagem e muitos artigos da crueldade humana catalogados nos Estatutos Divinos. Cada ser vive com a consciência que estrutura. De acordo com os seus códigos, impressos em profundidade na consciência, recolhe as ressonâncias como experiências reparadoras ou propiciatórias de libertação. 

Há, em nome do amor, casos de aparentes expiações: seres mutilados, surdos-mudos, cegos e paralisados, hansenianos e aidéticos, entre outros, que escolheram essas situações para lecionarem coragem e conforto moral aos enfraquecidos na luta e desolados na redenção. Jesus, que nunca agiu incorretamente, é o exemplo máximo. Logo após, Francisco de Assis, que elegeu a pobreza e a dor para ascender mais, não expurgava débitos, antes demonstrava-lhes a grandiosidade dos benefícios.

Helen Keller, Steinmetz e muitos outros heróis de ontem como de hoje são lições vivas do amor em forma de abnegação, convidando à felicidade e ao bem. As expiações podem ser atenuadas, não, porém, sanadas. Enquanto as provações constituem forma de sofrimento reparador que promove, as expiações apenas restauram o equilíbrio perdido, reconduzindo o delituoso à situação em que se encontrava antes da queda brutal.

Transitam, ainda, na Terra, portadores de expiações que não trazem aparência exterior. São os seres que estertoram em conflitos cruéis, instáveis e insatisfeitos, infelizes e arredios, carregando dramas íntimos que os estiolam, afligindo-os sem cessar. Podem apresentar aparência agradável e conquistar simpatias, sem que se liberem dos estados interiores mortificantes. A consciência não perdoa, no que concerne a deixar no olvido o crime perpetrado. O seu perdão se expressa mediante a reabilitação do infrator. As origens do sofrimento estão sempre, portanto, naquele que o padece, no recôndito do seu ser, nos painéis profundos da sua consciência.

Ao lado das origens cármicas do sofrimento, surgem as causas atuais, quando o homem busca mediante a irresponsabilidade, a precipitação, a prevalência do egoísmo que o incita à escolha do melhor para si em detrimento do seu próximo. Essa atitude se revela em forma de emoções perturbadoras, que o aturdem na área das aspirações e se condensam em formas de aflição. As emoções perturbadoras galvanizam o homem contemporâneo, mais do que o de ontem, em razão dos conflitos psicossociais, socioeconômicos, tecnológicos e outros.

Os impulsos e lutas que induzem o individuo à perda da individualidade, escravizando-o aos padrões de conveniência vigente, são relevantes como desencadeadores de sofrimento. Também a perda do senso de humor torna a criatura carrancuda e artificial, gerando emoções perturbadoras. A ausência da liberdade pelas constrições de toda ordem igualmente proporciona sofrimento. Esses fenômenos psicológicos, no campo do comportamento, propiciam emoções afligentes tais como: o desejo, o ofuscamento, o ódio, a frustração. 

Porque não sabe distinguir entre o essencial e o supérfluo, o que convém e aquilo que não é licito conseguir, o homem extrapola nas aspirações e atormenta-se pelo desejo malconduzido, ambicionando além das possibilidades e transferindo-se de uma para outra forma de amargura. O desejo é um corcel desenfreado que produz danos e termina por ferir-se, na sua correria insana. A primeira demonstração de lucidez e equilíbrio da criatura é a satisfação ante tudo quanto a vida lhe concede. Não se trata de uma atitude conformista, sem a ambição racional de progredir, mas, sim, de uma aceitação consciente dos valores e recursos que lhe chegam, facultando-lhe harmonia interior e bem-estar na área dos relacionamentos, no grupo social no qual se situa.

Toda vez que o desejo exorbita, gera sofrimento, em razão de tornar-se uma emoção perturbadora forte, que desarticula as delicadas engrenagens do equilíbrio. Narra-se que a infelizmente célebre Messalina, após uma larga noite de desejos e orgia, foi interrogada por Cláudio, ao amanhecer, igualmente aturdido – “Estás satisfeita?”. Ao que ela teria redarguido: “Não, cansada!”. Febre voraz, o desejo faz arder as energias, aniquilando-as. Sempre se transfere de uma para outra área, por conduzir o combustível da insatisfação. 

Males incontáveis se derivam da sua canalização equivocada, em face das suas nascentes no egoísmo, este câncer do Espírito, responsável por danos contínuos no processo da evolução do ser. Mesmo na realização edificante, o desejo tem que ser conduzido com equilíbrio, a fim de não impor necessidades que não correspondem a realidade. O ideal do bem, o esforço por consegui-lo expressam-se de forma saudável quão gratificante, tornando-se estimulo para o desenvolvimento constante dos germes que dormem na criatura, aguardando a eclosão dos fatores que lhes são propiciatórios.

Como o efeito do desejo, o ofuscamento, que decorre da presunção e do orgulho, é causa de sofrimentos, em razão do emaranhado de raízes na personalidade do homem ambicioso e deslumbrado, com Narciso ante a própria imagem refletida no lago. As ilusões da prosperidade econômica e social, cultural e política induzem o insensato ao ofuscamento, por permitirem-lhe acreditar-se superior ao demais, inacessível ao próximo, colocando barreiras no relacionamento com as outras pessoas que lhe pareçam de menor status, qual se estas lhe ameaçassem a situação de destaque. Ignoram os fenômenos biológicos inevitáveis da enfermidade, velhice e morte, ou anestesiam a consciência para não pensarem nas ocorrências do insucesso, da mudança de situação, das surpresas do cotidiano.

Todos esse fatores são motivos de sofrimento, quando se pretende manter a posição de relevo, quando se teme perdê-la e quando isso acontece. O ofuscamento desgoverna inumeráveis existências que se permitem as fantasias do trânsito orgânico, sem a claridade que discerne entre as reais e as falaciosas metas da vida. Na mesma trilha, ressalta o domínio do ódio nas paisagens dos sofrimentos humanos. As suas irradiações destrutivas comburem as energias de quem o sustenta, enquanto, muitas vezes, atingem aqueles contra quem se dirigem, caso permaneçam distraídos dos deveres relevantes ou em faixas mentais equivalentes.

Loucura do amor não atendido, o ódio revela a presença predominante dos instintos agressivos vigentes, suplantando os sentimentos que devem governar a vida. Jamais havendo motivo que lhe justifique a existência, o ódio é responsável pelas mais torpes calamidades sociais e humanas de que se tem conhecimento. Quando se instala com facilidade, expande as suas raízes como tenazes vigorosas, que estrangulam a razão, transformando-se em agressividade e violência, em constante manifestação. Em determinados temperamentos, é qual uma chispa insignificante em um monte de feno, produzindo um incêndio devorador. Por motivo de somenos importância, explode e danifica em derredor.

O ódio é causador de muitos sofrimentos. Todo o empenho deve ser envidado para desarticulá-lo onde se apresente e instale; sem esse trabalho, ele se irradia e infelicita. Pestilencial, ele contamina com facilidade, travestindo-se de irritação, ansiedade, revolta e outros danosos mecanismos psicológicos reagentes. A frustração, por sua vez, responde por sofrimentos que seriam evitáveis, não fossem as exageradas esperanças do homem, as suas confusas idéias de automerecimento, que lhe infundem crenças falsas nas possibilidades que não lhe estão ao alcance.

Porque se supõe credor de títulos que não possui, a criatura se frustra, entregando-se a reações inesperadas de depressão ou cólera, fugindo da vida ou atirando-se, rebelde, contra ela e os seus valores. Quando o homem adquire a medida do pouco ou quase nenhum merecimento pessoal, equipa-se de harmonia e fé, de coragem e paz para enfrentar as vicissitudes e superá-las, nunca se permitindo malograr nos empreendimentos. Se esses não oferecem os resultados desejados, como é natural, insiste, persevera, até a constatação de que outro deve ser o campo de atividade a desenvolver ou até receber a resposta favorável do trabalho envidado. 

O amor é o antídoto para todas as causas do sofrimento, por proceder do Divino Psiquismo, que gera e sustenta a vida em todas as suas expressões. Luarizado pelo amor, o homem discerne, aspira, age e entrega em confiança, irradiando energia vitalizadora, graças à qual se renova sempre e altera para melhor a paisagem por onde se movimenta. O amor é sempre o conselheiro sábio em qualquer circunstância, orientando com eficiência e produzindo resultados salutares, que propelem ao progresso e à felicidade. Na raiz de qualquer tipo de sofrimento sempre será encontrado como seu autor o próprio Espírito, que se conduziu erroneamente, trocando o mecanismo do amor pela dor, no processo da sua evolução.

A fim de apressar a recuperação, eis que se inverte a ordem dos acontecimentos, sendo a dor o meio de levá-lo de volta ao amor, por cuja trilha se faz pleno. 

“O homem tem de lutar com o problema do sofrimento. O oriental quer livrar-se do sofrimento, expulsando-o; o ocidental procura suprimi-lo com remédios. Mas o sofrimento precisa ser superado, e o único meio de superá-lo é suportando-o. Aprendemos isso com Ele (o Cristo Crucificado). Carl Gustav Jung.”


quinta-feira, 25 de setembro de 2014

VOCÊ VAI ENCONTRAR UMA MULHER INCRÍVEL E VAI PERDÊ-LA por Alexandre Petillo



Existem alguns tipos de mulheres que você vai encontrar na vida. Tem aquelas que te fazem enlouquecer por uma noite. Tem aquelas que vão chegar e vão te fazer esquecer todas as outras. Tem também aquelas que você acredita que quer passar a vida toda ao lado delas. E, ainda, aquelas que você realmente vai ter certeza que vai passar a vida toda lado a lado. E tem as mulheres incríveis.

As mulheres incríveis não são como as que você sempre sonhou.Elas são bem mais. Geralmente elas chegam no momento em que você, por alguma razão, não vai conseguir segurar a bronca. Você vai perdê-la. E, pior, o que vai ficar na lembrança não será a razão de tudo acabar, mas sim os bons momentos. No caso dela, os momentos incríveis. E lembrar desses momentos é bem mais doloroso, acredite.

Lembro cada segundo que vivi ao lado da minha mulher incrível. A gente naquele restaurante, ela de blusa azul, os cabelos pretos, olhos hipnotizantes, vindo me abraçar, o beijo mais intenso da vida. O riso solto, aquela boca toda aberta, gostosa. O apetite quase-macho para um vinho e sexo sem escrúpulos. A dançadinha sexy ao som do MPB naquele barzinho, alta noite, cabelos solto. E ela ainda sabe tudo de futebol, literatura, política. Os momentos em que ela deixava de ser amulher-fatal-incrível pra ser só uma menina que quer um ombro – ali, o meu. E você realmente acredita que o mundo é bacana.

Ela quase ter sido sua é muito pior do que ela nunca ter sido. O que é ter do seu lado tudo aquilo que sempre desejou que Deus fizesse daquela parte da sua costela. Pele macia, morena, sarcástica, cheia de frases, definições e comportamentos. Atrevidos, apaixonantemente tímidos, quando lhe convém. Impõe sua presença. Conhece as regras tanto de um jantar cinco estrelas como de uma trepada num pulgueiro qualquer, alta madrugada. Ela é um tratado. Ela é jazz. Ela é uma Zelda Fitgerald moderna. Por ela até eu, coração atleticano, fiquei com mais simpatia pelo Cruzeirense. Como disse, ela é mais, mais até do que a rivalidade clubística. E ela quase foi minha.

Quando a vida aperta, são esses momentos com a minha mulher incrível que eu lembro. Dói, mas, ei, é por isso que a gente está nessa vida. Se em algum momento você tem alguma dúvida se a vida vale, são momentos como esses que atestam que sim.Sua esperança é que eles em algum ponto futuro se repitam. A vida vale.

Te lembrou alguma coisa, caro leitor? Você já passou por uma mulher dessa? Ela está aí, enquanto você lê esse arrazoado de qualidade duvidosa, circulando só de calcinha e camiseta da Patti Smith? Aproveite, guarde esse momento. Cedo ou tarde ela vai embora e a culpa vai ser sua. Mas como ela é incrível, vai viver sem mágoas, ser sua amiga, vai te chamar para tomar cerveja, bater papo, você vai nutrir a esperança de um novo encontro pelos anos seguintes. Até ela te dar um fora, como a minha fez, altamente educada e sutil, dizendo coisas como “tive que ir embora, mas te considero muito”. “Te considero muito”, da boca dela, é bem pior do que o “gosto de você como amigo” daquela paixão adolescente.

E dessas paixões, como diz o amigo Xico Sá, só vão ficar as memórias e o gosto da vodka que te ajudou a afogar as mágoas. Como o mestre ensinou, o segredo é tocar adiante, porque “não há guarda-chuvas para o amor. Não há barcos, salva-vidas, só perdição e enchentes”.Quando se perde uma mulher incrível, não é só uma derrota, é uma vida. Ela vai arrancar suas vísceras afetivas e mesmo assim você não vai deixar de sonhar com ela. As minhas vísceras ela arrancou via telefone, na chamada mais dolorosa que já ouvi. Fiquei um bom tempo sentado na calçada, telefone desligado, amaldiçoando a sorte e Graham Bell. Mas vale. Encare. Sofra. Bote pra fora. De uma forma bem melhor do que eu com essas mal traçadas. Depois me conte. Depois dela, seu coração estará calibrado para tudo. Ou quase.

Se ela reaparece, você casa.

Alexandre Petillo 
(adaptado)





DESMAIOS, ABUSOS E MORTES: ASSIM SE FABRICAM ROUPAS NO CAMBOJA por Revista Fórum

 

Infelizmente, muitos produtos que utilizamos têm origem no trabalho escravo, como já pude assistir em documentários. Lamentável !! Por isto temos que ter mais humanidade e menos consumo. Moda e ética já!
Roberta Carrilho


Multinacionais da moda têm sido acusadas de impor a seus trabalhadores condições laborais precárias e salários baixos, além de permitir que seus fornecedores demitam funcionários sem pagá-los

Em janeiro último, quando o mundo ainda se recuperava da ressaca do ano novo, as ruas de Phnom Penh, capital do Camboja, amanheceram lotadas. O motivo não era festivo: milhares de trabalhadores do setor têxtil pediam melhores condições laborais. Com as mesmas mãos que costuram as camisetas e calças que depois são vendidas da Espanha ao Japão, sustentavam cartazes nos quais reivindicavam o aumento de seu ínfimo salário, para enfrentar a alta do custo de vida no país asiático. Eles acabaram manchados pelo sangue de cinco trabalhadores, que morreram naquele 3 de janeiro por conta da dura repressão policial, e de quase 40 feridos que precisaram ser levados a hospitais. Um dos manifestantes continua desaparecido.

A situação desses trabalhadores, dentre os quais estão Hok Pov ou Ly Tola, chegou ao conhecimento da comunidade internacional depois que a blogueira Anniken Jørgensen decidiu denunciar tais práticas e focar suas críticas na gigante têxtil H&M. A multinacional sueca tem sido acusada, em diversas ocasiões, de permitir que seus fornecedores demitam funcionários sem pagá-los, que seus empregados protagonizem desmaios em massa ou simplesmente por lhes impor salários extremamente baixos. Após a denúncia de Jørgensen, a H&M se justificou assegurando que realiza um “extenso trabalho para, por exemplo, conseguir salários justos, promovendo os direitos dos trabalhadores, bem como locais de trabalho saudáveis e seguros”. No entanto, para Tola Moeun, coordenadora do programa de trabalho da ONG cambojana Community Legal Education Center (CLEC, na sigla em inglês), “o Wal Mart [o gigante norte-americano de distribuição] é a marca mais irresponsável. Outras como Inditex [conglomerado têxtil que engloba, entre outras empresas, a Zara] adotam práticas similares, mas tomam algumas medidas quando recebem queixas”.

Os assassinatos de janeiro não são os primeiros registrados na indústria têxtil e de calçados de Camboja, um setor que cresceu rapidamente durante os últimos anos, como consequência do aumento dos salários na China. Em fevereiro de 2012, três manifestantes morreram baleados pela polícia durante uma greve em uma fábrica onde eram confeccionados sapatos para a Puma. Em novembro, a polícia novamente abriu fogo contra os trabalhadores, e o resultado foram dez feridos e um morto. Neste caso, a fábrica produzia para empresas como Levi Strauss, Gap e H&M, entre outras. “Foi um grande revés para a situação dos direitos humanos [em Camboja]. Não houve nenhuma investigação para apurar responsabilidades em relação à atuação policial”, garante Sopheak Chan, presidente do Centro Cambojano de Direitos Humanos (CCHR, na sigla em inglês).

A atividade têxtil representa um dos principais setores industriais de Camboja e supre aproximadamente 84% das exportações do país, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho. Além disso, emprega cerca de 475 mil pessoas, que costuram em mais de 550 fábricas registradas pelas autoridades. O número aumenta, entretanto, se é incluída a quantidade desconhecida de oficinas clandestinas que funcionam no país como apoio às grandes fábricas durante as épocas de pico de trabalho, e que não são submetidas a nenhum tipo de controle.

Porém, as violações dos direitos trabalhistas são frequentes nos dois tipos de centros produtivos. Hok Pov sabe bem disso. Ao longo dos últimos dez anos, trabalhou para várias fábricas registradas, nas quais foi obrigada a enfrentar jornadas intermináveis, insultos de seus capatazes e pagamentos irregulares. “O pior de tudo é não ter a certeza de quanto vai durar o trabalho”, afirma a cambojana.

Por todo esse tempo, Hok Pov emendou contratos de seis meses que eram renovados um ou dois dias antes de expirar. Exceto em duas ocasiões. A primeira, por conta de uma gravidez não desejada. “Tomei pílulas para abortar porque não queria perder meu trabalho. Mas estava grávida de gêmeos e só perdi um”, conta. Poucos dias depois, procurou uma curandeira para abortar o segundo feto. O agressivo método utilizado para interromper a gestação a deixou tão debilitada que não conseguiu trabalhar por vários dias e acabou sendo despedida. “Nem sequer me deram a compensação a que eu tinha direito”, relata. Na segunda ocasião, seu contrato foi rescindido após ter participado de um protesto para melhorar a ventilação da fábrica. “Há poucos ventiladores e temos que passar muitas horas ali, sem descansar”, narra.

A legislação cambojana determina jornada de oito horas, durante seis dias na semana, com no máximo duas horas extras diárias. O total nunca deve ultrapassar as 60 horas semanais. Não obstante, os sindicatos denunciam que os trabalhadores constantemente cumprem até 80 horas por semana, sobretudo durante os períodos de maior consumo nos países desenvolvidos, como as semanas que antecedem o natal. Devido a essas horas extras, é possível elevar o salário de 78 euros a 128 por mês, valor que os sindicatos consideram correspondente a uma jornada de 48 horas semanais. “Chamo-os de ‘incentivo à morte’, pois os trabalhadores precisam tanto do dinheiro que trabalham até a extenuação”, declara Tola Moeun.

O excesso de trabalho, somado à alimentação precária e às elevadas temperaturas, provocaram diversas sequências de desmaios em massa nas oficinas. O último de que se tem notícia ocorreu em agosto, quando mais de cem trabalhadores de seis fábricas diferentes, situadas no mesmo complexo industrial, apagaram. “Better Factories”, um programa da OIT lançado em 2001 para melhorar as condições de trabalho nos centros têxteis do Camboja, tentou resolver a situação em 2011, proporcionando comida grátis aos trabalhadores.


Vinte e sete trabalhadoras desmaiaram, em fevereiro, enquanto trabalhavam em uma fábrica da Shimano no Camboja (Foto: Community Legal Education Center)

Todavia, somente neste ano, ao menos mil pessoas desmaiaram, quase 200 a mais em relação ao mesmo período de 2013, segundo dados do Ministério do Trabalho a que teve acesso o jornal Cambodia Daily. “Os desmaios massivos são midiáticos, mas eles acontecem todos os dias, com pelo menos dois ou três trabalhadores”, explica Moeun.

As fábricas cambojanas também foram denunciadas por conta da presença de menores nas linhas de produção. Ly Tola foi contratada por uma delas há cinco anos, quando tinha apenas 14. A lei cambojana proíbe os menores de 18 anos de trabalhar, mas Ly apresentou o documento de sua irmã mais velha para conseguir o emprego. Ninguém comprovou, entretanto, que a irmã trabalhava há alguns meses na mesma fábrica. Agora, elas costuram juntas e vivem em uma pequena casa nos arredores da oficina, onde dividem um quarto com outras seis pessoas. “Mandamos a maior parte do dinheiro para nossos pais, então sobra muito pouco para nossos próprios gastos”, diz a jovem, que nasceu em uma aldeia localizada a duas horas da capital.

As ONGs têm poucas esperanças em relação à melhora das condições de trabalho em um futuro próximo. “Houveram poucos progressos no que se refere a isso ao longo dos últimos anos, e os mais recentes relatórios de controle apontam para uma degradação das condições”, atesta um documento da CCHR produzido em janeiro. A OIT é mais otimista, e em um relatório de junho, assevera que ocorreram progressos no que diz respeito aos pagamentos de salários e aos benefícios concedidos aos trabalhadores, ainda que as qualifique somente como “pequenas melhoras”.



(Crédito da foto de capa: Community Legal Education Center)

Por Laura Villadiego, no El Diario | Tradução por Anna Beatriz Anjos