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sexta-feira, 8 de julho de 2016

EDITORA ALEMÃ PLANEJA REPUBLICAR VERSÃO ORIGINAL DE "MINHA LUTA" LIVRO ESCRITO POR ADOLF HITLHER

Se publicar uma edição em português tenho interesse em adquirir porque é fascinante estudar uma mente brilhante como foi do ditador antissemita Adolf Hitler. Sem sombras de dúvidas ele foi um homem do mal, mas genial. Suas ideologias políticas de EXTREMA DIREITA só trouxeram mal a humanidade, sofrimento e horror. É por estas e outras que eu sou centro-esquerda. Sou contra tudo que ele fez e seus pensamentos eram de um facínora, monstro, etc. Mas lendo a gente aprende o que não se deve permitir voltar a ser praticado no mundo. Roberta Carrilho

Intenção da Editora Schelm é relançar manifesto antissemita de Hilter sem comentários críticos de historiadores. Embora especialistas apontem que é hora de Alemanha lidar com passado nazista, editora pode ser alvo da Justiça.


Exemplar de "Minha Luta" assinado por Hitler


Em meio a grande agitação, o livro Minha Luta, de Adolf Hitler, voltou às prateleiras das livrarias alemãs em janeiro deste ano 2016 – como edição comentada. A primeira tiragem, com cerca de 3,7 mil notas de historiadores que contextualizam a obra, esgotou em poucas semanas.

A publicação da edição comentada se tornou possível após os direitos autorais do livro terem expirado e a obra ter caído em domínio público, 70 anos após a morte do ex-ditador nazista. Em termos legais, a obra é considerada sediciosa. No entanto, os comentários críticos do Instituto de História Contemporânea, sediado em Munique, possibilitaram sua publicação de forma legal.

Esse não é necessariamente o caso da nova edição que a editora alemã de direita Schelm pretende lançar em meados do ano – em sua forma original, sem contextualização crítica.

Baseada em Leipzig, a Schelm já está aceitando encomendas em seu site para a "reimpressão inalterada", que, segundo os editores, vai servir como fonte de educação pública e documentação histórica para o universo acadêmico.

Os planos da Schelm foram anunciados numa livraria de Forchheim, ao norte de Nurembergue. "A editora divulgou que planejava vender a versão original e anunciou o livro com uma imagem de Hitler", afirmou à DW Christopher Rosenbusch, porta-voz do Ministério Público local, que indiciou uma investigação. Um anúncio do tipo já pode ter consequências legais.

De acordo com as leis alemãs contra a incitação ao ódio racial, republicar o manifesto original é ilegal. Os investigadores avaliam agora se vão apresentar queixa contra a editora.

Estratégias de dissimulação
A Schelm argumentou que planeja publicar o texto com um comentário como prefácio, o que não seria suficiente para que seja considerado material de pesquisa. "Falar de educação pública nesse caso não faz o menor sentido", afirma Hajo Funke, professor do Instituto de Ciências Políticas em Berlim. "Trata-se de um texto antissemita, que só serve para criar agitação."

Na Alemanha, qualquer pessoa que incite o ódio contra um indivíduo devido à sua origem nacional, racial, religiosa ou étnica pode ser acusada de perturbação da ordem pública. Qualquer glorificação do nazismo é passível de processo judicial.

No entanto, estudantes ou acadêmicos que usarem Minha Luta como parte de seus trabalhos acadêmicos não são alvo da Justiça. Por essa razão – e para se proteger legalmente – a Schelm está tentando vender sua edição como um serviço acadêmico e, em seu site, a editora se distanciou de passagens odiosas do livro.

Fala por si só, no entanto, o fato de que o domínio volkstod.com pertença à editora, algo que pode ser traduzido como "morte do povo.com", e de que a Schelm publique somente livros de orientação de direita.

"Essas estratégias de dissimulação sempre estiveram em jogo", disse Kai Brinckmeier, especialista em extremismo de direita. "Havia um site na internet, semelhante ao Wikipedia, com uma lista de tópicos destinados a negar o Holocausto. Os estudantes que buscavam informações na web corriam o risco de levar as informações a sério, caindo assim na armadilha dos neonazistas."

Edição comentada de "Minha Luta" publicada pelo Instituto de História Contemporânea de Munique pesa cinco quilos

Proibição não é resposta
Apesar do conteúdo controverso, não houve um banimento específico da publicação do livro desde que entrou em domínio público. "Mas um banimento não iria, necessariamente, evitar que o ideário se enraizasse na cabeça de muitas pessoas", afirma Brinckmeier. Para o especialista, no entanto, há o risco de que alguém que, a princípio, não tinha nada a ver com o movimento de extrema direita possa acabar levando tais pontos de vista em consideração por meio da distribuição do livro.

Horst Pöttker, professor da Universidade de Hamburgo, também disse considerar que uma proibição não seria eficaz. Segundo ele, a versão comentada é um bom meio-termo. Ele mesmo quis publicar uma edição semelhante há alguns anos, mas na época os direitos autorais ainda estavam em vigor.

"Na Alemanha, teme-se uma onda de extremismo de direita [se o livro for publicado], mas esse não é o caso em outros países. Até mesmo em Israel, Minha Luta é vendido na versão original", explicou o professor.

Para Pöttker, a reação na Alemanha mostra que cidadãos do país não sabem lidar com o passado nazista. "Existe uma necessidade urgente na sociedade de se encontrar, finalmente, um caminho apropriado para resgatar esse passado, cultural e publicamente", afirmou Pöttker. "Minha Luta faz parte do discurso público. E agora a ala de extrema direita tenta fazer suas próprias incursões."

Minha Luta em contexto histórico
Minha Luta não é somente uma diatribe. O livro também contém ideias que teriam agradado a alguns membros de classes alemãs com maior nível educacional na época de Hitler. "[Hitler] escreveu que se deveria ler muito, e Munique é descrita como uma cidade linda", aponta Pöttker.

Hoje, o texto pode ser colocado claramente num contexto ideologicamente racista, que levou a campos de concentração e extermínio de judeus. "O fato de Hitler ter escrito sobre sua ideologia racial e Auschwitz em Minha Luta serve para provar que todos aqueles que negam o Holocausto estão errados", acrescentou o professor.

Apesar de suas objeções, Funke acredita que a editora Schelm está preenchendo uma lacuna de mercado com seus planos de uma edição não comentada. "A versão com comentários críticos é muito instrutiva, mas também muito assustadora", afirma o cientista político, acrescentando que ela não seria apropriada para uma interpretação crítica ampla. "A análise crítica poderia, facilmente, ter sido feita ao longo de 200 páginas."

Funke diz estar interessado em como o caso Schelm vai avançar, porque se queixas forem apresentadas, isso pode acabar tendo efeito sobre a edição comentada publicada pelo Instituto de História Contemporânea. "Mesmo com seus comentários, o texto também poderia ser visto como um meio de glorificar os conteúdos do livro. Nesse caso, ele também não teria uma base legal sólida", conclui.












Fonte: http://www.dw.com/pt/editora-alem%C3%A3-planeja-republicar-vers%C3%A3o-original-de-minha-luta/a-19312356

HITLER ANTES DE HITLER por Volker Ullrich


Como foi a infância e a juventude do mais odiado ditador da História

Um jovem quase comum - Adolf Hitler

No filme A Queda, de Bernd Eichinger, o famoso ator Bruno Ganz interpreta Adolf Hitler em seus últimos dias, acuado no bunker da Chancelaria do Reich, em pleno processo de negação e declínio psicológico. A atuação magistral de Ganz fez com que muitos se perguntassem: “Podemos retratar Hitler como um ser humano?”. 

O historiador alemão Volker Ullrich defende que não só podemos como devemos. Ullrich é o autor de uma nova biografia do ditador nazista, Adolf Hitler Vol. 1 – Os Anos de Ascensão, 1889-1939 (Amarilys, 2016). O trabalho, aclamado pela crítica e best-seller instantâneo na Alemanha e na Inglaterra, é o primeiro tomo de uma obra em dois volumes que se propõe a preencher lacunas na bibliografia já existente e, principalmente, tratar do ser humano por trás da persona pública. 

O simples processo de demonização, segundo o autor, é um erro perigoso, pois distorce a avaliação da verdadeira personalidade de Hitler, com suas contradições e antagonismos, deixando de lado os traços empáticos que fizeram dele um líder palatável às massas populares e às elites política e econômica da Alemanha. O objetivo é desconstruir o mito Hitler, presente de variadas maneiras na literatura e no debate público após 1945 como uma “fascinação (negativa) pelo monstro”. Na nova obra, Hitler é “normalizado”, mas isso não o torna “mais normal”; pelo contrário, ele parece ainda mais indecifrável. Sua imagem torna-se mais complexa, um homem de muitas faces, sempre adaptadas a diferentes públicos.

Baseando-se em pistas conhecidas e documentos revelados apenas recentemente, Ullrich discute que, se não fosse pela Primeira Guerra Mundial e as revoluções sociais que ela provocou na Europa, talvez Hitler permanecesse uma figura desconhecida às margens da História. Suas origens são, para dizer o mínimo, nebulosas. “Não sei de nada sobre a história da minha família. Nessa questão, sou uma pessoa muito mal informada (...) sou completamente desprovido de sentimentos familiares e não tenho nenhuma ligação com um clã. Isso não é de minha natureza. Eu pertenço à minha comunidade étnica”, confessou Hitler em 1942, num de seus muitos monólogos. 

Talvez ele visse boas razões para ocultar sua ascendência. O pai de Hitler, Alois Schicklgruber, era um filho ilegítimo adotado por um tio postiço, Johann Nepomuk Hiedler (irmão mais novo do marido da mãe de Alois), numa história enrolada que sugere algum escândalo familiar abafado. Somente aos 19 anos Alois foi registrado como filho legítimo de Johann Georg, o irmão de Johann Nepomuk. Nessa ocasião, o notário alterou o sobrenome Hiedler para Hitler. Alois Hitler viria a ser um funcionário-modelo na alfândega de Braunau. Em 1885, após ficar viúvo pela segunda vez (as taxas de mortalidade na época eram altíssimas), Alois casou-se com Klara Pölz. Klara era neta do tio postiço de Alois. Portanto, se de fato Alois era filho de Johann Georg, os dois seriam primos em segundo grau. Se, como se suspeita, fosse filho de Nepomuk, o parentesco seria ainda mais próximo, o de tio e sobrinha. 

Em 1889, nascia Adolf Hitler, o quarto filho do casal (os três primeiros morreram cedo). Boatos sobre uma possível origem judaica de Hitler (que circulavam desde a década de 1920) não se confirmaram. Ainda assim, é irônico que o ditador que exigia um certificado de “ascendência ariana” de cada cidadão alemão não fosse capaz de demonstrar a própria. 

Existem poucos testemunhos sobre os primeiros anos de vida de Adolf Hitler. As informações publicadas por ele sobre o ambiente familiar no primeiro capítulo de Minha Luta certamente são uma mistura de meias-verdades e invenções, com as quais tentou angariar simpatias e tornar crível sua vocação política como líder de um novo Reich alemão. Sabe-se que Alois fora um pai severo, adepto de castigos físicos. A experiência da violência doméstica foi interpretada como uma das causas para a política assassina do ditador. No entanto, Ullrich adverte que se deve tomar cuidado ao tirar conclusões: naquela época, castigos físicos eram comumente usados com finalidade educativa. Um pai repressor e uma mãe amorosa não eram uma combinação rara entre as famílias de classe média por volta da virada do século. Hitler, portanto, teve uma infância bastante normal. 

Juventude incerta
Adolf Hitler fora um excelente aluno nos primeiros anos escolares. Como todos os garotos de sua idade, era leitor dos romances de aventura do escritor alemão Karl May (dizem que durante a guerra, principalmente nas situações mais difíceis, Hitler citava um dos heróis de May, o índio apache Winnetou, como um “paradigma de comandante militar”). Entretanto, quando fez a transição para a escola secundária em Linz, Hitler passou a ser mais um entre muitos. Terminou por abandonar a escola, após reprovações e resultados medíocres. 

O fracasso em terminar o grau secundário custou caro, quando ele se inscreveu para o exame de admissão na Academia de Belas-Artes de Viena, já que o diploma era um requisito básico. Hitler (mais livre após a morte do pai, em 1903) passara a fazer visitas frequentes à capital, em que se deleitava com as paisagens da metrópole austríaca, com seus museus, a ópera, o Parlamento e a magnífica Ringstrasse. O fracasso acadêmico, que ele não contara à família ou aos amigos, foi difícil de aceitar. Muitos atribuem a perseguição aos intelectuais e seu desprezo pela intelligentsia alemã como resultado dessa rejeição.

O ano de 1907 foi marcado pela morte da mãe, em consequência de um câncer de mama. “Em meus quase 40 anos de atividade, nunca vi um jovem tão indescritivelmente triste e arrasado como o jovem Adolf Hitler”, escreveu o médico judeu que tratara Klara Hitler, doutor Eduard Bloch, em uma anotação de 1938. Não há indícios de que o tratamento médico feito por Bloch tenha sido a causa do patológico ódio antissemita de futuro Führer. No próprio dia do funeral, Hitler foi até o consultório dele para agradecer pelos cuidados com a mãe. 

Em 1938, quando o líder fez sua entrada triunfal na “cidade natal” Linz, após ter anexado a Áustria, dizem que perguntou imediatamente pela saúde do “bom e velho doutor Bloch”. Dentre todos os judeus de Linz, Hitler colocou o médico sob a proteção da Gestapo. No final de 1940, a família Bloch conseguiu emigrar em segurança para os Estados Unidos. 

Há relatos de que Hitler também manteve relações cordiais com judeus nos abrigos e pensionatos vienenses em que morou entre 1908 e 1913. Viena era na época a grande metrópole europeia, centro de uma vida econômica e cultural efervescente, com uma enorme comunidade de intelectuais e artistas de vanguarda. 

Naquela cidade, os problemas do Estado multinacional austro-húngaro podiam ser observados como numa lente de aumento. Nenhuma outra apresentava uma taxa de imigrantes tão elevada. A reação dos habitantes locais ao “perigo” de uma “infiltração estrangeira” produzira desde o final do século 19 a criação de associações e partidos que estampavam o nacionalismo radical entre as suas bandeiras. 

A imigração maciça, principalmente de judeus orientais, despertou temores de uma “judaização” de Viena; o sucesso dos imigrantes judeus, bem-educados e orientados a subir na vida, despertou inveja e amargura nos habitantes nativos. 

Hitler escreve em Minha Luta que os anos em Viena foram de miséria e pobreza. Outra meia-verdade, pois, enquanto durou a herança materna, a pensão de órfão e a ajuda que recebia de uma tia, Hitler teve condições de manter seu estilo de vida habitual: não fazer nada. Quando a tia que o socorria também faleceu, ele então teve de buscar o próprio sustento. 
 
Artista sem futuro
No outono de 1909, Hitler chegou a viver num abrigo para moradores de rua, onde conheceu Reinhold Hanisch. De manhã cedo, os ocupantes do abrigo tinham de deixar o lugar, retornando somente à noite. Durante o dia, Hanisch e Hitler tentavam ganhar alguns trocados fazendo bicos. Ao saber da inclinação artística do colega de abrigo, Hanisch sugeriu que Hitler pintasse os cartões-postais da cidade para que ele os vendesse em bares e restaurantes, dividindo a receita. O sucesso da empreitada foi maior que o esperado e em 9 de fevereiro de 1910 ambos conseguiram trocar o abrigo por um pensionato masculino. Hitler viria a morar ali pelos três anos seguintes.

A parceria com Hanisch durou pouco. Para que o negócio fosse rentável, era preciso pintar um quadro por dia, como cobrava o colega. Mas Hitler argumentava que se tratava de um trabalho artístico, para o qual era necessário estar inspirado; quando não estava, passava o dia lendo jornais ou participando de discussões políticas na sala de leitura do pensionato. 

Em agosto de 1910, Hitler acusou Hanisch de tê-lo enganado e deixado de pagar por algumas telas vendidas. Passou então a vender suas obras por meio de Jacob Altenberg e Samuel Morgenstern, dois judeus proprietários de uma loja de artes. Ambos pagavam a Hitler muito bem, permitindo-lhe independência financeira. Além de preferir fazer negócios com comerciantes judeus, Hitler mantinha boa convivência com outros moradores do pensionato que eram de origem judaica. 
O ex-sócio Hanisch viria a afirmar que “naquela época, Hitler não odiava os judeus. Isso só aconteceu mais tarde”. 
O contraste entre o pintor de telas parceiro de marchands, colega de quarto de judeus e o futuro ditador genocida é desconcertante. Para Ullrich, uma coisa é certa: mesmo que quisesse, Hitler não teria conseguido evitar contato com correntes antissemitas naquela Viena da virada do século. Políticos vienenses que Hitler admirava batiam constantemente na tecla do inimigo externo judeu: Georg von Schörener, o líder do pangermanismo austríaco a quem Hitler cita como influência fundamental em Minha Luta, associou sua campanha pelo “germanismo” com um antissemitismo até então desconhecido na Áustria; o prefeito Karl Lueger não media palavras ao dizer que “a Grande Viena não deve se transformar numa Grande Jerusalém”, além de acusar a “imprensa judaica” de compor uma imagem estereotipada de judeus abastados, intelectualmente refinados e arrogantes. 
Seria uma surpresa se o jovem Hitler não tivesse sido influenciado por isso.
Um outro aspecto desses anos que alimenta a curiosidade de historiadores é a suposta homossexualidade de Hitler. Na contramão de diversas obras que veem nas ações do ditador indícios de uma orientação sexual frustrada e reprimida, Ullrich não se convence de que Hitler pudesse ter tido relações homoafetivas no período em que morou nos pensionatos masculinos. No entanto, inúmeras fontes dão conta de um comportamento celibatário do futuro Führer. Numa metrópole vanguardista e de costumes em ebulição como era Viena, em que peças teatrais de Arhtur Schnitzler e quadros permissivos de Gustav Klimt causavam escândalo, o jovem Hitler vivia um ascetismo quase monástico. 

Ao que tudo indica, ele também não recorria a prostitutas. Segundo um amigo da época, isso se dava principalmente pelo medo de contrair uma doença sexualmente transmissível bastante comum na época: a sífilis. Mas talvez a ideologia pangermanista de Schörener também tenha desempenhado um papel nisso. Além de defender a superioridade cultural dos alemães, a dissolução do império multinacional Habsburgo e a formação de um Império Alemão único, Schörener defendia também o celibato até os 25 anos, a fim de tonificar a força física e intelectual. Se Hitler se manteve fiel a esse mandamento de castidade, ele ainda não tinha dormido com nenhuma mulher ao deixar Viena, aos 24 anos de idade.

Hitler já pensava em emigrar para a Alemanha havia algum tempo. Munique era a cidade que mais o atraía. Ali, ele frequentou o meio boêmio de Schwabing e seguiu ganhando a vida pintando paisagens. Sua senhoria o descreveu como um jovem retraído, que se fechava no quarto como um eremita. Para Ullrich, a falta de contatos era apenas um sinal externo de sua profunda insegurança interna. Após um ano na cidade, Hitler teve de admitir que sua carreira artística não lhe oferecia futuro. Somente o início da Primeira Guerra Mundial, no começo de 1914, o libertaria daquele estado frustrante e sem perspectivas.

Primeira Guerra Mundial
A escalada de hostilidades que se seguiu ao assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando produziu na Alemanha um estado de euforia patriótica a favor da guerra. O escritor Stefan Zweig viria a descrever esse momento “arrebatador” como “algo de que era difícil escapar”. Com o início do conflito, Hitler afirma ter obtido uma autorização do rei Ludwig III da Baviera para servir em um regimento bávaro apesar de sua nacionalidade austríaca. O mais provável é que naqueles dias tumultuados ninguém checasse com afinco a nacionalidade dos recrutas voluntários; do contrário, Hitler não poderia ter servido.

Em meados de outubro de 1914, o recruta Hitler enfrentou seu “batismo de fogo”. Seu regimento lutou em violentas batalhas homem a homem no front ocidental, tendo perdas imensas (de 3 500 oficiais, restaram 600). Em novembro, Hitler seria promovido a cabo, encarregado de levar mensagens e ordens dos comandantes de regimento até a linha de frente. Segundo Hitler, esse trabalho colocava todos os dias sua vida em risco. Para os soldados de trincheira, os mensageiros militares não passavam de oficiais de caserna. De uma forma ou de outra, Hitler escreveu em Minha Luta: “O horror assumiu o lugar do romantismo da guerra. 

O entusiasmo arrefeceu gradualmente e o júbilo excessivo foi sufocado pelo medo da morte”. Antes mesmo do final da guerra, a direita radical e os pangermanistas já haviam eleito bodes expiatórios para os revezes da Alemanha: as “atividades subversivas” de sociais-democratas e esquerdistas em geral, e a suposta falta de engajamento dos judeus no esforço de guerra. A despeito dos milhares de judeus que morreram nas trincheiras, foi convocada em 1916 uma “contagem de judeus” a fim de verificar a situação do serviço militar de judeus alemães (um primeiro passo para os registros que viriam a ocorrer nos anos seguintes). Em 1918, diante da derrota iminente da Alemanha, esses grupos intensificaram sua propaganda antissemita.

O rapaz tímido ainda estava para descobrir seus dons extraordinários de oratória, mas a Revolução Alemã, que derrubou o kaiser e instaurou uma república parlamentarista de inspiração esquerdista, provocou em Hitler tal comoção que o convenceu a abdicar de suas ambições artísticas e entrar na política. Junte-se a esse político aspirante com patronos influentes no meio militar a reação das elites econômicas ao novo governo, a fobia contra a esquerda e o ressentimento contra os judeus, e temos montado o cenário para a ascensão de Hitler e do nazismo. O Hitler pós-guerra se reinventou completamente, para prejuízo de milhões de vítimas que ele viria a fazer em sua ascensão sanguinolenta ao poder. Uma ascensão que, como Ullrich defende, merece ser mais bem compreendida.

SAIBA MAIS - LIVRO
Adolf Hitler Vol. 1 – Os Anos de Ascensão, 1889-1939, Volker Ullrich, 2016, Amarilys


Fonte: http://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/personagem/hitler-antes-de-hitler.phtml#.V3_5p9IrK5e




SER DESINTERESSADO POR POLÍTICA É UMA FORMA DE CULPA



Documentário dá voz a uma colaboradora passiva do nazismo: hoje com 105 anos, Brunhilde Pomsel foi secretária de Goebbels, uma das últimas de uma geração que "nada viu e de nada sabia". A DW  (Deutsche Welle é uma empresa de radiodifusão da Alemanha) entrevistou os diretores.

Brunhilde Pomsel, ex-secretária de Goebbels, é protagonista de documentário sobre a era nazista

Estreia no Festival de Cinema de Munique, nesta quarta-feira (06/07), um filme-entrevista sobre uma notável testemunha da era nazista: hoje com 105 anos de idade, Brunhilde Pomsel foi estenógrafa e secretária pessoal de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda de Adolf Hitler, nos últimos três anos da Segunda Guerra Mundial.

A partir de várias horas de entrevistas, quatro diretores – Christian Krönes, Olaf Müller, Roland Schrotthofer e Florian Weigensamer – montaram um documentário elucidador. A concepção de Ein deutsches Leben (Uma vida alemã) é quase minimalista: em preto e branco, suas longas sequências de diálogo só são interrompidas por breves cenas documentais.

Ao enfocar de forma distanciada uma contemporânea da época nazista que servia em posição subalterna, o resultado é mais convincente do que muitos dos incontáveis e pomposamente encenados programas da TV alemã sobre a Segunda Guerra e o Holocausto. A própria protagonista aprovou, comentando: "É importante, no fim da vida, ser colocada diante do espelho e reconhecer tudo o que se fez errado."

A Deutsche Welle entrevistou dois dos diretores, Christian Krönes e Florian Weigensamer.

Diretores Roland Schrotthofer, Christian Krönes e Florian Weigensamer (da esq. para a dir.) no Festival de Munique

DW: Brunhilde Pomsel se mostrou imediatamente disposta a participar de Ein deutsches Leben?
Christian Krönes: Nós encontramos a Sra. Pomsel por acaso, no decorrer de uma outra pesquisa. Esse não mais esperado encontro com uma lenda viva foi, então, pretexto para nós arriscarmos a tentativa. Quando começamos a rodar, ela estava com 101 anos. Nós sabíamos que não íamos ter muito tempo mais, mas queríamos fazer esse filme de todo jeito.

Como transcorreram os preparativos e a filmagem?
CK: Levou um tempo para ela relaxar, pois ela tinha tido experiências muito ruins com a mídia, que apresentou a história dela e as entrevistas de forma muito abreviada. Levou algum tempo para convencê-la. Quando ela estava pronta, aí enfrentou com grande concentração e disciplina os trabalhos de rodagem, certamente muito cansativos para ela. Foi realmente a primeira vez que se abriu de forma abrangente.

O espectador tem a impressão de que a Sra. Pomsel se expressa e também reflete com honestidade. Vocês também tiveram essa sensação durante as gravações?
CK: Não acredito que ela tivesse recalcado os fatos. Ela certamente refletiu. Ela também participa muito dos acontecimentos atuais, reflete sobre o presente, sobre a própria vida. Sem dúvida, na narrativa dela há fórmulas de expressão que se repetem. Com certeza ainda há um detalhe ou outro, uma história ou outra, que ela não nos contou e que nunca contou.
Por outro lado, de certa forma ela fez uma confissão sobre a própria vida. Quando lhe mostramos o filme, de que gostou muito, ela pronunciou uma frase francamente admirável: como é importante, no fim da vida, ser colocada diante do espelho e reconhecer tudo o que se fez errado.

Ela oscila entre "rechaçar a culpa" e "confessar". Isso ainda é o reflexo do comportamento de muitos após a Segunda Guerra?
CK: Acho que a Sra. Pomsel é representativa de milhões de outras pessoas, de milhões de colaboradores passivos que tornaram possível esse sistema. Isso é provavelmente o aspecto que torna esse filme histórico, esse documento da história recente, tão interessante para o presente. O filme conta sobre uma sociedade funcional que sai dos eixos: crise econômica mundial, desemprego, ascensão dos nacional-socialistas – menos de uma década mais tarde, isso desemboca na maior catástrofe da história da humanidade.

No presente estamos, de certa maneira, numa situação muito semelhante, o que torna o filme moderno e atemporal. Superamos uma crise econômica e somos atingidos por uma onda de refugiados. Por toda a Europa, os partidos de direita se fortalecem. O problemático é que não é apenas um país, como a Alemanha naquela época, mas desta vez é o continente europeu como um todo que de certa maneira vai resvalando para a direita.

Uma cena mostra a Sra. Pomsel reagindo de forma emocional, que é quando ela fala da morte dos filhos de Goebbels. Em relação às outras vítimas, ou seja, judeus, civis, etc., a reação dela é menos emocional. O que isso revela?
Florian Weigensamer: Há ainda uma segunda cena, que trata de Sophie Scholl e da resistência. Pomsel diz: "Esses pobres jovens, executados por causa de um panfleto..." Ambas as cenas demonstram muito bem, acho, que para a Sra. Pomsel o que estava em jogo eram sempre as emoções pessoais, e nunca o "estar acima dos fatos", o panorama político global. Isso, ela nunca viu.

Ela tem pena dos dois pobres jovens executados por causa de um panfleto: "Se eles tivessem ficado de boca fechada, estariam vivos até hoje." Em si, isso é uma constatação absurda, mas que, no mundo dela, tem lógica. Pois ela só se importa com essas duas pessoas. E, com os filhos de Goebbels, o que conta para ela são apenas as emoções pessoais: "As pobres criancinhas..." Para ela, todo o desvario em volta não conta.

Brunhilde Pomsel no Festival de Cinema de Munique, ladeada pelos diretores de "Uma vida alemã"

Vamos falar de estética cinematográfica: vocês trabalham em preto e branco e sem comentários, e inserem apenas breves documentários entre os blocos de entrevistas, filmes de propaganda nazista ou rodados pelos Aliados logo após a libertação dos campos de concentração.
CK: O tema em questão é atemporal. Nós queríamos experimentar lhe dar uma estética também atemporal. Nós optamos pela variante em preto e branco, que dá esse caráter; mediante a situação de estúdio, nós situamos Brunhilde Pomsel fora do espaço e do tempo.

FW: O material de arquivo não se pode comentar: em si, ele já é propaganda. Intervir novamente aí seria propaganda ao quadrado, disfarçada de material histórico. Nós queríamos deixá-lo intencionalmente dessa forma, sem música, sem cortes, sem a nossa intervenção. Queríamos caracterizar o material pela finalidade para que foi produzido. Aí, ele conta uma história diferente da que se costuma ver nos especiais de televisão.

Se bem que não se trata só de propaganda nazista: também as sequências registradas por americanos e russos depois da libertação são mostradas sem comentários. Por quê?
FW: É claro que, de certo modo, é para ser também um contraponto à visão da Sra. Pomsel sobre essa época. "Ah, meu Deus, os judeus... Eu nem percebi nada... os campos de concentração..." Então é simplesmente preciso mostrar o que foi e que era perfeitamente possível saber, sim, se se quisesse, e se tivesse visto essas imagens.

Essa é a única acusação e a única culpa que ela carrega. Olhar para o lado é culpa, sim, e ser apolítico já é culpa suficiente. A intenção não foi desmascará-la como nazista. Isso ela decerto não era. Ela só era desinteressada – e isso é, justamente, uma forma de culpa.













Fonte: http://www.dw.com/pt/ser-desinteressado-por-pol%C3%ADtica-%C3%A9-uma-forma-de-culpa/a-19377077