sexta-feira, 8 de agosto de 2014

FAZER ANIVERSÁRIO É... Roberta Carrilho


Hoje é dia do meu aniversário, me peguei pensando...fazer aniversário...o que isso significa? Acumular anos de vida sim, mas, principalmente, é comemorar os resultados de uma trama que tece o enredo de uma existência em parcelas de acertos e enganos, fracionando o tempo em etapas vividas - como estações que alternam os meses e alteram o clima, dão o tom e tiram a cor, aquecem e refrigeram, florescendo e forrando o chão da vida.

Mais um ano, que não foi um ano comum, passou deixando suas marcas, ensinamentos, mudanças profundas, saudade, alívio e gratidão. É comum no final de cada ano uma espécie de recolhimento, a necessidade da reflexão. 

Pra mim, o pedido veio agora. 

Foram quinze mil e trezentos e trinta dias até aqui, é hora de olhar pra trás, hora de despedidas, de encarar os fatos, de desapegar, de viver fortes emoções. Hora de sentir vazios, de espiar os sonhos, soltando partes de mim mesma. Hora de reconstruir, ajustar, não ignorar as tristezas e agradecer pelas inúmeras alegrias. E é hora de celebrar, expulsando memórias, lembrando dos pequenos gestos, suavizando os ressentimentos, retardando as inquietações. É hora de agregar valores novos, de polir as ideias, de limpar as mágoas, de encomendar esperança, hora de virar a página, de prender a fera e soltar a criança. É hora de parir novos sonhos, de alcançar as metas, de rir o meu riso e de chorar o meu pranto. Hora da conscientização, de avaliar - da (re)conciliação!

São muitos anos, mais de quinhentos meses, tantos fatos, ilusões, sonhos, enganos, sabedoria, frustrações, satisfações, decepções - e escolhas. Algumas me levaram para o aprendizado difícil, me mostraram os espinhos, me sangraram a alma, roubaram o céu, trazendo o que eu precisava aprender. Chorei, me recolhi, refiz planos, travei de medo, revi os enganos e senti vergonha; bebi da minha fonte turva, olhei em olhos tristonhos, ouvi e fiz lamentações. Desabei, cometi deslizes, falei o que não devia, me precipitei, julguei - e mal! - ignorei a intuição que batia, fiz pouco da sorte, fui atrevida, medrosa, fiz previsões e me frustrei. Magoei pessoas que amo, fui magoada, esqueci as promessas íntimas que me fiz, tive dias tão pesados que nem sei como sobrevivi. Acreditei e confiei, mas nem sempre adiantou - construí sonhos, esquecida de que dependia de muitas pessoas para que se realizassem, então de novo me frustrei, e aí agredi, e novamente me vi diante de lições que não aprendi. Falhei comigo e com os outros, senti a impotência me ensinando sobre flexibilizar, retomei o olhar que perdi, mergulhei em mim mesma e fiz novas escolhas, porque nem tudo aprendi...

Outras escolhas, no entanto, me fizeram gargalhar, levaram por caminhos férteis, onde semeei temperança, uma dose boa de esperança - e uma extra, de humildade. Quero colher os frutos bons, porque se penei atravessando tempestades, hoje quero o calor do sol e a claridade. Algumas dessas escolhas foram muito difíceis, implicavam num adeus mudo, só meu, que precisava - e merecia! - ser sereno, e foi onde mais aprendi, foi quando mais sofri, foi a travessia mais dolorosa. Mas foi a mais generosa ponte para as lições mais importantes. Fiz escolhas que me propiciaram momentos perfeitos, alguns trouxeram alegrias que são inesquecíveis, reencontros, proximidade, afetos resgatados, ousadia e coragem. Concretizei sonho antigo, antes tateei insegura pra sentir o gosto forte da superação! Parte de minhas escolhas ainda me farão caminhar, porque os sonhos estão incompletos e precisam que eu persevere e saiba esperar. Confio que os resultados esperados serão novos dias de muita alegria e farta comemoração!

E houveram as escolhas que não fiz, aparentemente, mas ter filhos é esperar da vida as grandes e as melhores surpresas. Ter família é mais do que um porto seguro, é a certeza de trocas importantes, de tensão e união, de calor nas discussões e nos abraços, de momentos felizes, de laços e nós. A minha ocupa o podium da minha existência, lidera de longe minhas emoções, não raro implode minhas convicções...risos... e é a fonte que abastece de alegria o meu coração. É o laço eterno que envolve meu mundo e orienta meu caminhar, é o conforto, a constante motivação. 

Sonhei na adolescência que teria uma família linda, unida, amorosa, uma família com meu nome e sobrenome. Filhos(as) e um esposo-amante-amigo-especial. Não foi possível; mas o importante que eu sonhei e desejei. 

Sou um feixe de nervos e serenidade, sou as duas metades da dualidade, sou a oposição da contradição mais perfeita, a soma da sombra e da luz que me rodeiam, a incompletude do ser imperfeito. Sou ampla, restrita, generosa, rígida, sorridente e chorona. Sou a veia que pulsa, a raiz profunda, os galhos nus, a fruta madura. Sou as manhãs frias, as noites escaldantes, o cheio, o vazio. Sou a letra muda, o som alto, a música calma, a dança frenética. Sou o avesso, o viés, o alinhavo, o ponto cheio, a agulha que alfineta. Me enterneço e sou espinho. Às vezes atravesso, desafino. Sou o afago, a mão estendida, ciumenta, ansiosa, rude, ácida e amorosa. Tenho manias, segredos, medos, desejos, angústias. Tenho crises de riso e de choro, picos de irritação e surpresas tão boas que nem acredito. Tenho amigos queridos, projetos, saudades, ideias, fraquezas, bom humor, limitações. Tenho hábitos antigos, anseios, comportamentos novos, arrependimentos, novas crenças, velhos gostos, aprendizados e falhas. Muitas vezes peco por excesso, ou deixo a desejar e nem percebo, subtraio, esvazio, questiono, procuro, perco, ganho. Sou rio, oceano, gota pequena. Sou um universo vasto, infinito, incompleto, bonito, humano, imperfeito, a eterna aprendiz!!

Eu sou a mulher que aprendeu com os erros, que reverencia a vida, persiste, tem coragem, se espanta e se comove, sonha, divaga e acredita. Sou aquela que diz coisas horríveis e se arrepende, que houve bobagens e releva, e as horríveis, nem sempre esquece, mas perdoa, é perdoada. Mais resiliente, alimento minha criança interior, sou responsável e correta, mas também vacilo, me engano - e desabo. Sou a terapeuta dedicada, intuitiva, acolhedora, imperfeita; sou a amiga presente, cedo o coração, o colo, o ombro, mas nem sempre correspondo; sou a filha que ama, que cuida, se preocupa, comete deslizes e decepciona; sou a irmã e a tia amorosa que às vezes se descuida; sou a cunhada afetuosa, amiga e agradecida; sou a mãe que ama demais, que cuida, se preocupa, socorre, ri e chora junto, agrada, abraça, mas desaponta; ama, ama, ama...e é amada!

Nessa reflexão não esqueci de meus sonhos desfeitos, dos momentos de desespero, das renúncias, da insegurança diante de cada decisão, das noites enormes e dos dias vazios, mas lembro que os tombos foram os momentos de descanso, e sou obrigada a concluir que tenho muita sorte, e que, por todos os anos que vivi, pude encher um enorme "baú de lembranças" caras e lindas, amealhando um tesouro precioso. Por tudo que vivi, pelos últimos acontecimentos na minha vida, pelas pessoas que dela fazem parte, pela saúde que todos temos, pelas oportunidades e recursos maravilhosos para usufruir dessa vida abençoada, sou infinita e imensamente grata!

Roberta Carrilho




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