quinta-feira, 26 de março de 2015

O AMOR QUE DESEJO PRA VOCÊ por Jocê Rodrigues



Desejo a você um amor real, um que não seja a sua metade e que por isso mesmo a queira por inteiro.





Te desejo um amor de verdade, um amor real, que te faça ouvir músicas ruins e que, quem sabe, seja digno de ser inspiração pra uma, um amor que faça seu coração palpitar forte nos primeiros encontros e que depois de algum tempo não faça mais, que finja não ouvir seus roncos durante a noite e que também finja que não sabe que você flerta com outras pessoas.

Te desejo um amor que te arranque risos nas horas impróprias e que durma várias vezes durante um filme do Bergman, que seja leal mesmo quando não estiver sendo fiel, que aceite numa boa tomar cerveja quando faltar vinho, que tenha alguns surtos de vez em quando e te faça ter uns também.

Te desejo um amor que te leve às alturas, mas que te aconselhe a levar um paraquedas só por segurança, que construa junto com você a rotina chata e entediante mais invejada pelos outros casais, que reclame quando você decidir passear descabelada e de pijama pela casa toda, mas que no fundo ache isso de um charme desconcertante, um amor que te ajude a pendurar cuecas e calcinhas no varal com a mesma alegria e disposição de quem vai ao dentista fazer um canal, mas que mesmo assim esteja lá, firme e forte nessa tarefa tão nobre e unificadora.

Te desejo um amor que trapaceie no videogame, que goste de coisas que você não gosta, que faça sexo quando você quiser fazer sexo, que faça amor quando você quiser fazer amor e que mesmo sendo inseguro quanto ao tamanho do pau que tem se empenhe duro em te convencer que é a qualidade que importa.

Te desejo um amor que saiba dizer não pra você, que te faça ter vontade de mandá-lo tomar no cu de vez em quando, que não tenha forças pra resistir às suas chantagens sexuais, que faça piadas infames e que saiba rir não apenas com você, mas também de você.

Te desejo um amor que não seja a sua metade e que por isso mesmo a queira por inteiro, que seja sala de estar e despensa, sofá e penteadeira, chuveiro e goteira, que seja oscilante feito balanço de maré e te desafie a velejar mesmo quando estiver sem bússola, seguindo apenas as estrelas do céu.

Eu te desejo um amor imprevisível, cheio de defeitos, falhas e desvios. Enfim, desejo a você um amor pelo qual vale a pena dizer não à companhia da solidão.

*Crônica originalmente publicada na revista CATWALK




Fonte: © obvious: 





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